Mudei para São Paulo há mais de 20 anos, por
causa do trabalho. Meus pais moravam no Rio de Janeiro e comentaram, na época, que
matavam a saudade toda noite no intervalo do Jornal Nacional, na TV Globo. É
que havia um comercial do Banco Bamerindus (hoje HSBC) com o ator Toni Lopes
que, segundo eles, era a minha cara. Curioso, prestei atenção ao comercial e confirmei a semelhança. Afinal, minha própria mãe
havia dito isso e - ouvi minha vida inteira que - coração de mãe não se engana!
Depois fui trabalhar em uma outra
empresa que, por coincidência, mantinha a conta-salário no Bamerindus. Alguns
diretores - mesmo os com fama de mais sisudos - me chamavam de
"Bamerindus" nos corredores da empresa. Os colegas estimulados com o exemplo
de cima, logo aderiram ao apelido.
Havia um posto bancário na empresa. Tentei me aproveitar da situação fazendo
valer meu direito a tratamento preferencial. Alegava ser o sósia do top model da instituição, mas não
funcionou. Eu tinha mesmo era que entrar na fila para pagar as contas e
descontar os cheques. Quando havia rodízio na agência e mandavam uma pessoa que
não me conhecia para o caixa do posto, ela, já sabendo da brincadeira do sósia,
fazia a mesma pergunta quando chegava minha vez no guichê: - É você, não é? Eu respondia:
- Sou!
Por um bom tempo, no mercado, no
táxi, no posto de gasolina perguntavam se eu era ele. Sempre disse que não. Ao fazer
compras e pagar com cheque, invariavelmente, o vendedor ou o caixa ou até
mesmo os dois diziam: - Agora sei de onde conheço você! E a minha resposta era:
- Esse Bamerindus!... Pois é, só de pirraça, usava a frase que virou o bordão no
comercial, dando credibilidade ao cheque e, ao mesmo tempo, deixando a dúvida
no ar...
O mesmo acontecia em Sampa e no Rio. Uma
vez fui ao Teatro Serrador, no Centro do Rio, para assistir a uma peça de
teatro revista com a Patrícia Blair, filha da Brigite. Era o final do
expediente de uma viagem a trabalho e eu vestia terno. Por não enxergar muito
bem de longe, sento, sempre, nas primeiras filas. Foi o bastante para, quase no
final do espetáculo, a Patrícia me chamar ao palco para escolher a vedete mais
bonita e dar um beijo nela. Não fiz a menor cerimônia. Subi, peguei o microfone
e dirigi-me à platéia fazendo piada, mas usando um tom solene: - Quero, em
primeiro lugar, deixar bem claro que não
sou o cara do Bamerindus!!!
A gargalhada foi geral e eu adorei a
experiência no teatro lotado. A Patrícia comentou em cena aberta que não sabia
que eu era colega, elogiando meu desembaraço. Um pouco mais tarde, caminhando em
frente à loja Mesbla, no Passeio Público, percebi que alguém acenava e gritava
de dentro de um ônibus que se afastava: - Valeu Bamerinduuus !!! Aquele fim de
tarde representou, para mim, uma espécie de consagração no Rio. Desfrutei a
sensação de ser famoso, embora apoiado no sucesso de outrem. Voltei a usar a
mesma frase, uma meia dúzia vezes, em grupos e situações diferentes, mas sempre
com a mesma boa receptividade.
Outra vez, em Sampa, fui conhecer
o famoso Café Photo na despedida de solteiro de um amigo. Foi só eu colocar o
pé dentro da casa que uma garota muito bonita parou diante de mim, colocou as
duas mãos sobre as próprias bochechas, arregalou os olhos e falou alto: - Bamerindus!!! Você aqui??? Risada
geral. É, a festa não era minha, mas a entrada foi triunfal. Considerei o pequeno episódio a minha consagração na paulicéia.
Com o tempo me acostumei. Até hoje, quando
sou apresentado a algumas pessoas com
mais de trinta, percebo aquele olhar de "de onde conheço esse cara?"
Agora acontece com muito menos freqüência, é claro, mas
ainda acontece. Mais recentemente, no final de um curso sobre roteiro para
cinema, sentei-me ao lado do roteirista Bráulio Mantovani, durante a happy hour. Ele me olhou e, de cara, fez
a indefectível pergunta: - De onde é que eu conheço você antes desse curso?
Respondi com a teoria sobre o Efeito Bamerindus, baseada na semelhança
física do ator do comercial comigo. Ele ouviu com atenção e comentou que é
porque o personagem permanece no
inconsciente coletivo, apesar de mais uma década fora do ar. Ainda bem que fui
sósia de um personagem simpático, bonachão e que esbanjava credibilidade.
Termino fazendo um agradecimento e uma
modesta homenagem ao ator Toni Lopes, desaparecido em 2004, que, sem saber, me proporcionou
momentos agradáveis, engraçados e a sensação de ser uma pessoa conhecida. Valeu Toni!!!
Ator TONI LOPES
imagem obtida na Internet, sem autoria visível.